"É ilegal", garante Helena Roseta, presidente da Assembleia Municipal (AM) de Lisboa. A arquiteta não tem dúvidas: a Câmara não pode perdoar ao Benfica 1,8 milhões de euros de taxas municipais e, mais do que isso, apesar do aval dado pelo executivo camarário de António Costa, a última palavra cabe à AM. Contas feitas, Roseta tem a certeza de que a medida vai ficar pelo caminho.
"Estou convencida de que isto não passará", disse a presidente da AM no seu comentário habitual na SIC Notícias, esta terça-feira. Roseta fez as contas aos protestos já tornados públicos por parte dos vereadores comunistas, sociais-democratas, populares e do Movimento Nós Cidadãos e acha que a oposição se vai unir para derrotar os socialistas, que apesar de serem os mais votados, não têm a maioria absoluta da AM (o PS tem 36 dos 75 lugares da Assembleia Municipal).
Roseta ainda não convocou a reunião, onde uma decisão final será tomada, mas admite que ela possa acontecer "dentro de 15 dias". Antes, a presidente da AM de Lisboa quer ouvir os pareceres de duas comissões camarárias – Património e Finanças; Questões Urbanísticas – para depois poder sustentar uma decisão. Mas já tem uma posição sobre a matéria. O pedido do Benfica não tem suporte legal e, como "na legislação há uma coisa chamada responsabilidade dos titulares de cargos políticos, se um autarca aprovar um benefício que não tenha enquadramento legal, pode incorrer num crime, com uma sanção penal elevada". "Não estamos a brincar", afirmou a autarca.
Benfica TV e Media Markt "não são utilidade pública"
O perdão ao Benfica conta-se em poucas linhas, mas em muitos anos de relação com a autarquia de Lisboa. O clube assinou dois protocolos – um em 1995, outro em 2004 – em que beneficiava de isenções no pagamento de taxas camarárias em virtude da "utilidade pública" dos serviços que prestava. Há 11 anos, o SLB obteve uma autorização camarária para criar um novo loteamento de mais de 57 mil metros quadrados de novas edificações, mas acabou por alargar a área construída em mais 38.393m2 "relativamente ao autorizado pelo alvará". É precisamente neste acréscimo de construção que foram instalados o novo museu do clube, mas também a estação televisiva Benfica TV e até uma grande superfície comercial, o MediaMarkt.
Na hora de regularizar a situação, o Benfica invocou o protocolo assinado para beneficiar do desconto fiscal. O Executivo de António Costa despachou a proposta benfiquista para a AM, pela mão de Manuel Salgado, que, em declarações ao "Público", assumiu que apesar de "politicamente incorreta", a solução apresentada pelo Benfica era "sensata".
Um coro de vozes entre os vereadores da oposição levantou-se contra essa ideia. Na ata da reunião em que o assunto foi discutido, o primeiro a manifestar "perplexidade e alguma estranheza" foi o vereador comunista. Carlos Moura vê "aspetos muito gravosos" na proposta benfiquista e reclama que "um clube como o Benfica ser isento de taxas ou cedências não é exatamente uma situação muito justa em relação à situação do país".
António Prôa, do PSD, concorda. "Não posso deixar de manifestar o meu desconforto com o facto de haver obras ilegais durante tantos anos com as quais a Câmara convive", disse na reunião, defendendo não ser "normal uma área tão substancial de construção ser ilegal e nada acontecer". E se a esta ilegalidade se juntar uma isenção de taxas, então torna-se "discutível e injustificável". A crise vem de novo ao de cima como argumento, mostrando que os tempos do Euro 2004 já passaram. "Num tempo em que vivemos dificuldades financeiras, os portugueses e os lisboetas toleram cada vez menos estes tratamentos desiguais, injustificados, a algumas entidades".
Ao "chumbo" do PSD, juntam-se os Populares. Gonçalves Pereira, do CDS/PP, tem "as maiores reservas em relação a esta isenção de taxas que está a ser feita a um determinado clube, seja ele qual for". João Afonso e Paula Marques, ambos do Movimento Nós Cidadãos, também manifestaram "reservas muito profundas em relação à dimensão desta isenção". "É nossa preocupação fazermos uma legalização de um processo que durante anos e anos esteve ao serviço de uma superfície comercial que é uma fonte de lucro", disse Paula Marques, para quem "o Benfica não é propriamente uma instituição sem fins lucrativos".
"O que não é atividade desportiva de um clube desportivo não nos parece pertinente beneficiar de um tratamento de favor", concluiu o vereador social-democrata, acrescentando que a "atividade comercial" exercida pelo "MediaMarkt, algumas lojas desportivas ou mesmo a Benfica TV, que é um canal de cabo pago", só podem ser "consideradas como as demais atividades comerciais". Ou seja, sem direito a bónus.
in expresso.pt