Harrison Okene falou à Reuters na terra natal, Warri, na Nigéria
Um nigeriano sobreviveu 60 horas fechado na casa de banho de um barco no fundo do Atlântico. Lembra-se de ouvir os peixes comer os companheiros mortos e de rezar para ser salvo. Foi encontrado por mergulhadores, que ficaram chocados por o encontrarem… vivo.
Harrison Okene sobreviveu 60 horas no fundo do Oceano Atlântico, confinado a uma casa de banho do Jacson-4, um navio rebocador que naufragou ao largo da Nigéria, a 26 de maio.
Dois dias e meio após o naufrágio, mergulhadores encontraram Harrison Okene com vida, encurralado numa casa de banho do navio, preso à vida numa bolha de ar com pouco mais de um metro de altura.
"Não sei o que impediu a água de encher aquele quarto. Só chamava por Deus. Salvou-me. Foi um milagre", contou Harrison Okene, ouvido pela Agência Reuters, que revela a história deste cozinheiro nigeriano ao Mundo.
O barco virou, à força das ondas, a cerca de 30 quilómetros da costa da Nigéria, quando ajudava na estabilização de uma plataforma petrolífera da empresa americana Chevron. Das 12 pessoas a bordo, foram recuperados os cadáveres de 10 e duas foram dadas como desaparecidas.
Eram 4.50 horas da madrugada de 26 de maio quando Okene, de 29 anos, sentiu o barco a tombar. Estava na casa de banho, e forçou a porta de ferro à procura da escotilha de saída. Foi arrastado pelo corredor pela água em turbilhão para outra casa de banho, nos aposentos de um oficial.
Não sabe como, mas estava vivo e a respirar quando sentiu o barco a pousar no fundo. "Estava muito escuro. Não via nada mas sentia que não estava sozinho, que havia ali corpos de companheiros mortos. Apareceram peixes que começaram a comê-los. Conseguia ouvi-los. Foi horrível", contou.
Vestindo apenas cuecas, Okene sobreviveu na água gelada da casa de banho, de cerca de 1,20 metros, agarrado ao lavatório para manter a cabeça fora de água no barco virado ao contrário.
Esteve nisto cerca de 24 horas. Não sabe ao certo quando, mas ganhou coragem e nadou para a cabine do oficial e tentou tirar painéis da parede do quarto para usar como uma jangada que o mantivesse acima do nível da água.
"Estava ali na água, no meio da escuridão total, a pensar que seria o fim. Sempre à espera que a água enchesse o compartimento, o que acabou por não acontecer", conta Harrison Okene.
"Estava esfomeado, mas principalmente tinha sede. A água salgada levou-me a pele da língua", recorda Oneke, desconhecendo que a empresa proprietária do barco, a West African Ventures, tinha contratado mergulhadores para procurar os corpos dos desaparecidos.
"Ouviu o barulho de um martelo a bater na embarcação. Bum, bum bum. Mergulhei e encontrei um cantil. Puxei o filtro da água e comecei a bater no interior do casco na esperança de que me ouvissem", contou.
Os mergulhadores entraram no barco e Okene viu a luz de uma lanterna no corredor. "Entrei na água e dei um toque com a mão no mergulhador. Acenei-lhe quando se virou. Ele ficou chocado", contou.
A equipa de mergulhadores equipou Okene com uma garrafa de oxigénio, fato e máscara de mergulho, e trouxe-o de volta à superfície. Eram 19.32 horas de sexta-feira 28 de maio, 60 horas após o naufrágio do Jacson-4.
Passou outras 60 horas numa câmara de descompressão, porque se o corpo tivesse sido exposto imediatamente ao ar exterior teria morrido, e voltou à terra natal, Warri, na Nigéria, onde falou ao jornalista da Reuters.
"Às vezes, em casa, parece que a cama está a afundar. Penso que ainda estou no mar e acordo a gritar", contou Okene, que não decidiu ainda se voltará ao mar.
Jn